quinta-feira, 29 de julho de 2010

Passeio Campestre





Talvez seja toda a nudez translúcida do céu azul que se vislumbra
entre nossas faces úmidas a se tocarem, flácidas,
sob a brisa diurna.

Talvez seja a frescura dos vendavais de outono
envolvendo o prado de nossos cabelos atônitos
que se emaranham junto à relva molhada
enquanto deitamos no chão,
morosamente enamorados.

Talvez sejam os saltitantes pássaros que sobressaltam os telhados
de nossos enclausurados olhares, sedimentados no tom
evasivo das nuvens.

Talvez sejam os lírios e seus perfumes

ou aquele enxame de estrelas sobrevoando à mesma altura
de nossos ombros enquanto somos apenas um pequeno ponto
a palpitar-se no pico mais alto da
montanha.

Talvez então seja você aqui do meu lado tornando os meus sentidos
mais aguçados e assim tudo fica mais bonito com os seus dedos
e os meus entrelaçados,
com os seus olhos em meu rosto acoplados,
com seus seios em meu peito ensimesmados

enquanto rolamos sorrateiramente nus
pelos jardins de nossa secreta
cidade.



Gabriel Nogueira Ferreira

(poema publicado no livro "Alçando voo" da AFL)

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Marc Chagall

Marc Chagall (Vitebsk, Bielorrússia, 7 de julho de 1887 — Saint-Paul-de-Vence, França, 28 de março de 1985) foi um pintor, ceramista e gravurista surrealista russo-francês.

Tive a felicidade de contemplar as obras deste maravilhoso artista durante uma exposição intitulada "O mundo mágico de Marc Chagall", realizada em Belo Horizonte-MG. Encantador! Os quadros de Marc Chagall nos proporciona uma viagem a um mundo repleto de fantasias, de mundos imaginários e seres fantásticos. Aquilo que nos é familiar, ganha dimensões inusitadas em suas pinturas. Daí sua magia. Seres e objetos adquirem novas características, novas possibilidades de existência. A realidade não importa. O que se emerge em suas obras são novas realidades. Nada é copiado. Tudo é inventado, a partir de sua pintura. Somos, então, remetidos ao caos, ao estranhamento, à perplexidade. Eis o devaneio! Portanto, segue abaixo algumas de suas obras...abraços!!!




Wedding (1918)


Violinista verde


Vaca com guarda-sol (1946)




The promenade




The holy coachman (1911-12)





Chuva (1911)



O galo (1929)




O concerto (1957)





O bêbado (1911-12)







O aniversário (1915)






Acrobata






Madonna with the sleigh (1947)







Homenagem a Apollinaire





Flauta mágica






Eu e a aldeia (1911)





Carruagem voando





Dança






Os deuses da aldeia

















































































































































































































































































































































terça-feira, 20 de julho de 2010

O poeta e as palavras






“Cada palavra é um encantamento” (Novalis)
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“A palavra é um ser vivente, mais poderosa que aquele que a usa; nascida da escuridão, cria o sentido que quer” (Victor Hugo)
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“Há na palavra algo de sagrado que nos impede de fazer dela um jogo de azar. Manejar com engenho uma língua significa exercer uma espécie de magia encantadora” (Mallarmé)
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“Sempre foi privilégio da lírica deixar oscilar a palavra em seus múltiplos significados” (Hugo Friedrich)
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“O poeta cede a iniciativa às palavras que são colocadas em movimento pelo embate de sua disparidade” (Mallarmé)
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“O poeta está só com sua linguagem” (Hugo Friedrich)
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“Artista, cria e não fales!” (G. Benn)
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“Oh bocas, o homem quer uma nova linguagem, sobre a qual nenhum gramático tenha qualquer coisa a dizer” (Apollinaire)

quarta-feira, 14 de julho de 2010

William Blake


FRASES

"Se as portas da percepção estivessem limpas, tudo se mostraria ao homem tal como é, infinito".

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"A eternidade anda enamorada dos frutos do tempo".

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"Prisões se constroem com pedras da Lei; Bordéis, com tijolos da religião".

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"O caminho do excesso leva ao palácio da sabedoria".

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"Os tigres da ira são mais sábios que os cavalos da instrução".

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"Exuberância é beleza".

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"Uma só idéia impregna a imensidão".

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"O rugir de leões, o uivar de lobos, o furor do mar em procela e a espada destruidora são fragmentos de eternidade, demasiado grandes para o olho humano".

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"O Progresso constrói caminhos retos; mas caminhos tortuosos sem Progresso são caminhos de Gênio".

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Roland Barthes - "A morte do autor"


Seguindo o raciocínio de Blanchot (ver postagem anterior) de que a fala poética não é a fala de uma pessoa, mas sim, a fala da própria “fala”, ou seja, a própria linguagem se engendrando por si mesma no poema, somos remetidos ao que Roland Barthes designa como “morte do autor”. Para Barthes, o autor não é o proprietário da linguagem, pois é a própria linguagem que fala na obra. A escrita é uma experiência impessoal. Portanto, o autor não antecede e nem excede, mas nasce no aqui e agora da obra.
Então, vale a pena pessoal, conferir trechos deste belo texto de Roland Barthes intitulado “A morte do autor”, publicado em seu livro “O Rumor da Língua”. Deixemos que sua fala fale por si mesma!!!



A MORTE DO AUTOR (trechos)

“O autor reina ainda nos manuais de história literária, nas biografias de escritores, nas entrevistas dos periódicos, e na própria consciência dos literatos, ciosos por juntar, graças ao seu diário íntimo, a pessoa e a obra; a imagem da literatura que se pode encontrar na cultura corrente está tiranicamente centralizada no autor, sua pessoa, sua história, seus gostos, suas paixões; a crítica consiste ainda, o mais das vezes, em dizer que a obra de Baudelaire é o fracasso do homem Baudelaire, a de van Gogh é a loucura, a de Tchaikovski é o seu vício: a explicação da obra é sempre buscada do lado de quem a produziu, como se, através da alegoria mais ou menos transparente da ficção, fosse sempre afinal a voz de uma só e mesma pessoa, o autor, a entregar a sua ‘confidência’.
Apesar de o império do Autor ser ainda muito poderoso (a nova crítica muitas vezes não fez mais do que consolidá-lo), é sabido que há muito certos escritores vêm tentando abalá-lo. Na França, Mallarmé, sem dúvida o primeiro, viu e previu em toda a sua amplitude a necessidade de colocar a própria língua no lugar daquele que dela era até então considerado proprietário; para ele, como para nós, é a linguagem que fala, não o autor; escrever é, através de uma impessoalidade prévia — que não se deve em momento algum confundir com a objetividade castradora do romancista realista —, atingir esse ponto onde só a linguagem age, "performa", e não "eu": toda a poética de Mallarmé consiste em suprimir o autor em proveito da escritura (o que vem a ser, como se verá, devolver ao leitor o seu lugar)”. (...)
“O Surrealismo, finalmente, para não sair dessa pré-história da modernidade, não podia, sem dúvida, atribuir à linguagem um lugar soberano, na medida em que a linguagem é sistema, e aquilo que se tinha em mira nesse movimento era, romanticamente, uma subversão direta dos códigos — aliás ilusória, pois não se pode destruir um código, pode-se apenas "jogar" com ele —; mas recomendando sempre frustrar bruscamente os sentidos esperados (era a famosa ' 'sacudida'' surrealista), confiando à mão o cuidado de escrever tão depressa quanto possível aquilo que a cabeça mesmo ignora (era a escritura automática), aceitando o princípio e a experiência de uma escritura coletiva, o Surrealismo contribuiu para dessacralizar a figura do Autor”. Finalmente, fora da própria literatura (a bem dizer tais distinções se tornam superadas), a lingüística acaba de fornecer para a destruição do Autor um argumento analítico precioso, mostrando que a enunciação em seu todo é um processo vazio que funciona perfeitamente sem que seja necessário preenchê-lo com a pessoa dos interlocutores: lingüisticamente, o autor nunca é mais do que aquele que escreve, assim como "eu" outra coisa não é senão aquele que diz "eu": a linguagem conhece um "sujeito", não uma "pessoa", e esse sujeito, vazio fora da enunciação que o define, basta para "sustentar" a linguagem, isto é, para exauri-la”.
(...) “O Autor, quando se crê nele, é sempre concebido como o passado de seu livro: o livro e o autor colocam-se por si mesmos numa mesma linha, distribuída como um antes e um depois: considera-se que o Autor nutre o livro, quer dizer que existe antes dele, pensa, sofre, vive por ele; está para a sua obra na mesma relação de antecedência que um pai para com o filho. Bem ao contrário, o escritor moderno nasce ao mesmo tempo que seu texto; não é, de forma alguma, dotado de um ser que precedesse ou excedesse a sua escritura, não é em nada o sujeito de que o seu livro fosse o predicado; outro tempo não há senão o da enunciação, e todo texto é escrito eternamente aqui e agora. É que escrever não pode mais designar uma operação de registro, de verificação, de representação, de "pintura", mas sim aquilo que os lingüistas chamam de performativo, forma verbal rara (usada exclusivamente na primeira pessoa e no presente), na qual a enunciação não tem outro conteúdo (outro enunciado) que não seja o ato pelo qual ela se profere: algo como o Eu declaro dos reis ou o Eu canto dos poetas muito antigos; o escritor moderno, tendo enterrado o Autor, não pôde mais acreditar, segundo a visão patética dos seus predecessores, que tem a mão demasiado lenta para o seu pensamento ou para a sua paixão, e que, conseqüentemente, fazendo da necessidade lei, deve acentuar esse atraso e ''trabalhar" indefinidamente a sua forma; para ele, ao contrário, a mão, destacada de qualquer voz, levada por um puro gesto de inscrição (e não de expressão), traça um campo sem origem — ou que, pelo menos, outra origem não tem senão a própria língua, isto é, aquilo mesmo que continuamente questiona toda origem.
Uma vez afastado o Autor, a pretensão de "decifrar" um texto se torna totalmente inútil. Dar ao texto um Autor é impor-lhe um travão, é provê-lo de um significado último, é fechar a escritura. Essa concepção convém muito à crítica, que quer dar-se então como tarefa importante descobrir o Autor (ou as suas hipóteses: a sociedade, a história, a psique, a liberdade) sob a obra: encontrado o Autor, o texto está "explicado", o crítico venceu; não é de se admirar, portanto, que, historicamente, o reinado do Autor tenha sido também o do Crítico, nem tampouco que a crítica (mesmo a nova) esteja hoje abalada ao mesmo tempo que o Autor. Na escritura múltipla, com efeito, tudo está para ser deslindado, mas nada para ser decifrado; a estrutura pode ser seguida, ' 'desfiada" em todas as suas retomadas e em todos os seus estágios, mas não há fundo; a escritura propõe sentido sem parar, mas é para evaporá-lo: ela procede a uma isenção sistemática do sentido. Por isso mesmo, a literatura (seria melhor passar-se a dizer a escritura), recusando designar ao texto (e ao mundo como texto) um "segredo", isto é, um sentido último, libera uma atividade a que se poderia chamar contrateológica, propriamente revolucionária, pois a recusa de parar o sentido é finalmente a recusa de Deus e de suas hipóstases: a razão, a ciência, a lei”.

Maurice Blanchot - "A fala poética"



“A fala poética deixa de ser fala de uma pessoa: nela, ninguém fala e o que fala não é ninguém, mas parece que somente a fala ‘se fala’ (...) “Isso significa, em primeiro lugar, que as palavras, tendo a iniciativa, não devem servir para designar alguma coisa nem para dar voz a ninguém, mas têm em si mesmas seus fins."(...)
"Sob essa perspectiva, reencontramos a poesia como um potente universo de palavras cujas relações, a composição, os poderes afirmam-se, pelo som, pela figura, pela mobilidade rítmica, num espaço unificado e soberanamente autônomo. Assim, o poeta faz obra de pura linguagem e a linguagem nessa obra é retorno à sua essência. Ele cria um objeto de linguagem, tal como o pintor não reproduz com as cores o que é mas busca o ponto onde as suas cores dão o ser".
(...) "o poema entendido como um objeto independente, auto-suficiente, um objeto de linguagem criado por si só, mônada de palavras onde só se refletiria a natureza das palavras e nada mais, talvez seja então uma realidade, um ser particular, de uma dignidade, de uma importância excepcional, mas um ser e, por isso mesmo, de forma nenhuma mais próximo do ser, do que escapa a toda a determinação e a toda forma de existência.”


(BLANCHOT in “O Espaço Literário")

domingo, 11 de julho de 2010

Clarice Lispector




“Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo”.

sábado, 10 de julho de 2010

Octavio Paz - "Poesia e respiração"


"Etiemble afirma que o prazer poético talvez seja de origem fisiológica. E mais precisamente: muscular - muscular e respiratória". (...) O ritmo verbal é histórico, e a velocidade, lentidão ou tonalidades que o idioma adquire neste ou naquele momento, nesta ou naquela boca, logo tendem a se cristalizar no ritmo poético" (...) " O prazer poético é prazer verbal e está fundado no idioma de uma época, uma geração e uma comunidade.
(...) Recitar versos é um exercício respiratório, mas é um exercício que não termina em si mesmo. Respirar bem, plena e profundamente, não é só uma prática de higiene nem um desporto, mas uma maneira de nos unirmos ao mundo e participarmos do ritmo universal. Recitar versos é como dançar com o movimento total de nosso corpo e o da natureza". (...) "Recitar foi - e continua sendo - um rito. Aspiramos e respiramos o mundo, com o mundo, num ato que é exercício respiratório, ritmo, imagem e sentido, em unidade inseparável. Respirar é um ato poético porque é ato de comunhão. Ai, e não na fisiologia, reside aquilo que Etiemble chama de 'o prazer poético'."
(...) "o prazer poético se reduz a uma espécie de ginástica, na qual intervém os lábios, a língua e outros músculos da boca e da garganta." (...) "Os versos nos causam prazer porque provocam e suscitam movimentos agradáveis dos músculos". (...) "para que o verso seja belo as palavras devem estar dispostas na frase de tal modo que seja fácil o esforço requisitado para sua pronunciação". (...)
(Octavio Paz in O Arco e a Lira)

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Murilo Mendes


Murilo Monteiro Mendes (Juiz de Fora, 13 de maio de 1901Lisboa, 13 de agosto de 1975) foi um poeta brasileiro, expoente do Surrealismo brasileiro.
Serão apresentados aqui alguns de seus poemas publicados nas obras As Metamorfoses (1944) e Poesia Liberdade (1947). Tais obras tem como característica o imaginário surrealista. Os poemas exprimem uma lógica diferente, aquela dos sonhos, dos delírios, da fantasia e da imaginação sem limites. A ordem do mundo, do espaço e do tempo caem por terra. O poema subverte a natureza, subverte a ordem do mundo, possibilitando novas formas de experimentar os elementos da vida...novas formas de se encantar com o mundo!!! Abraços!!!
O EMIGRANTE

A Henri Michaux


A nuvem andante acolhe o pássaro
Que saiu da estátua de pedra.
Sou aquela nuvem andante,
O pássaro e a estátua de pedra.

Recapitulei os fantasmas,
Corri de deserto em deserto,
Me expulsam da sombra do avião.
Tenho sede generosa,
Nenhuma fonte me basta.
Amigo! Irmão! Vou te levar
O trigo das terras do Egito,
Até o trigo que não tenho.
Egito! Egito! Amontoei
Para dar um dia a outrem:
A sombra fértil de Deus
Não me larga um só instante.
Levai-me o astro da febre:
Eu vos deixo minha sede,
Nada mais tenho de meu.

(de As Metamorfoses)



ESTUDO PARA UM CAOS


O último anjo derramou seu cálice no ar.

Os sonhos caem na cabeça do homem,
As crianças são expelidas do ventre materno,
As estrelas se despregam do firmamento.
Uma tocha enorme pega fogo no fogo,
A água dos rios e dos mares jorra cadáveres.
Os vulcões vomitam cometas em furor
E as mil pernas da Grande dançarina
Fazem cair sobre a terra uma chuva de lodo.
Rachou-se o teto do céu em quatro partes:
Instintivamente eu me agarro ao abismo.
Procurei meu rosto, não o achei.
Depois a treva foi ajuntada à própria treva.

(de As Metamorfoses)

A LIBERDADE


Um buquê de nuvens:

O braço duma constelação
Surge entre as rendas do céu.

O espaço transforma-se a meu gosto,
É um navio, uma ópera, uma usina,
Ou então a remota Persépolis.

Admiro a ordem da anarquia eterna,
A nobreza dos elementos
E a grande castidade da Poesia.

Dormir no mar! Dormir nas galeras antigas!

Sem o grito dos náufragos,
Sem os mortos pelos submarinos.

(de As Metamorfoses)

***
O SONO


Dorme.
Dorme o tempo em que não podias dormir.
Dorme não só tu,
Prepara-te para dormir teu corpo e teu amor contigo.
Dorme o que não foste, o que nunca serás.
Dorme o incêndio dos atos esquecidos,
A qualidade a distância o rumo do pensamento.

O pássaro magnético volta-se,
As árvores trocam os braços,
O castelo parou de andar.

Dorme.
Que pena não poder me ver – puro – dormindo.

(de Poesia Liberdade)



ABSTRAÇÃO


O gramofone não diz que mundo me acho.
Onde ancora a âncora?
Que ligação têm os dedos com a dália que os segura?
O poema olha para mim, e, fascinado, me compõe.
A onde decretou medidas a meu respeito,
Meus braços resolvem atos
Cada um para seu lado.
Não tenho a ver comigo,
Nem me conheço:
Um estrangeiro pensa em mim fora do tempo
A idéia da máquina do meu corpo dentro do tempo.

(de Poesia Liberdade)



DESEJO


Ao sopro da transfiguração noturna
Distingo os fantasmas de homens
Em busca da liberdade perdida:

Quisera possuir cem milhões de bocas,
Quisera possuir cem milhões de braços
Para gritar por todos eles
E de repente deter a roda descomunal
Que tritura corpos e almas
Com direito ao orvalho da manhã,
À presença do amor, à música dos pássaros,
A estas singelas flores, a este pão.

(de Poesia Liberdade)

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Roberto Piva, Cláudio Willer e Afonso Henriques Neto lendo seus poemas.

fonte do vídeo: http://www.youtube.com/watch?v=to5_jnWtIf8

Pessoal, certamente, a poesia se torna mais potente quando vociferada. Na voz do poeta, o poema se emerge deleitando nossos ouvidos com seus jogos sonoros, com suas tonalidades e seus ritmos. Sim, o poema, quando vociferado, torna-se mais vivo. Os Beatniks, entre eles, Jack Kerouac e Allen Ginsberg, souberam fazer isto muito bem. Jim Morrison, vocalista da banda de rock norte-americana The Doors, além de cantar as músicas, recitava seus poemas durante os shows. Sua poesia tinha também uma potência invocante muito rara! No Brasil, poetas influenciados pelos Beatniks, entre eles, Roberto Piva, Cláudio Willer e Afonso Henriques Neto, deram também muita ênfase à sonoridade nos seus trabalhos . Valorizam a leitura dos poemas, extrapolando-os do livro, silenciado nas estantes empoeiradas das bibliotecas...silenciado pela mídia, etc. Para estes poetas, o poema deve ser lido em voz alta. Portanto, neste vídeo temos Roberto Piva, Cláudio Willer e Afonso Henriques Neto lendo os seus poemas. Abraços!!!