quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Federico García Lorca





Gazel da morte sombria


Quero dormir o sono das maçãs
Afastar-me do túmulto dos cemitérios
Eu quero dormir o sono daquele menino
Que queria cortar o coração em alto mar
Não quero que me repitam que os mortos não [perdem o sangue]
Que sua boca podre continua pedindo água
Não quero saber dos martírios que a erva dá
Nem da Lua, com boca de serpente, que trabalha antes do amanhecer.
Quero dormir um instante
Um instante; um minuto; um século
Mas que todos saibam que não morri
Que há um estábulo de ouro em meus lábios;
Que sou o pequeno amigo do vento Oeste;
Que sou a imensa sombra de minhas lágrimas
Cobre-me o despontar da aurora com um véu
Para que me atire punhados de formigas
E molha com água dura os meus sapatos
Para que resvale a pinça de seu lacrau
Porque eu quero dormir o sono das maçãs
Para aprender um pranto que me limpe de terra
Porque eu quero me juntar com aquele menino escuro
Que queria cortar o coração em alto mar.

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